A apaixonada relação de amor de uma mulher judia com um homem palestino, epicentro do romance "Uma barreira viva", da escritora Dorit Rabinyan, provocou polêmica em Israel após o Ministério da Educação do país tê-lo proibido por considerar que encoraja a "assimilação". Liat, israelense, e Jilmi, palestino, são os dois heróis de uma história fictícia que abala os alicerces da identidade israelense, e que gerou uma onda de protesto pelas redes sociais contra o ministro da Educação, Naftali Bennett, líder do partido nacionalista religioso Lar Judaico. "Comprei hoje vários livros. Acredito que é o livro que atualmente deve ser entregue aos alunos e alunas", escreveu em sua página do Facebook o chefe da oposição e líder trabalhista, Isaac Herzog, estimulando a população a comprá-lo. Para Herzog, "o ato agressivo e desnecessário de censurar um livro baseando-se em uma interpretação linear de seu conteúdo é outro tijolo do muro do medo, da segregação e da cerração que está sendo erguido pelo governo (do primeiro-ministro israelense, Benjamín) Netanyahu". Centenas de atores, publicitários, escritores e intelectuais em geral, assim como políticos e educadores, alçaram energicamente sua voz contra o boicote que o Ministério impôs ao romance de Dorit Rabinyan, escritora e roteirista de conhecida trajetória local. "Gader Jayá" (em hebraico), traduzido ao inglês como "Borderline" e publicado há um ano e meio, é a história de uma tradutora israelense e um artista palestino que se apaixonam em Nova York e que veem como seu amor resiste a apagar-se quando ambos devem retornar a Tel Aviv e Ramala, e enfrentar a crua realidade política da região. Ganhadora de vários prêmios locais e muito mais produtiva em sua juventude que na idade adulta, Rabinyan tinha passado quase despercebida com seu último livro até que vários professores de literatura hebraica pediram ao ministério para inclui-lo na lista de recomendados para os níveis avançados do ensino médio.Os membros da comissão acadêmica pertinente lhe deram o selo de apto, mas dois altos funcionários do ministério consideraram que era inadequado e ordenaram que o título fosse apagado da lista, para o que contaram com o apoio de Bennett. Um dos argumentos deste organismo é que é preciso preservar "a identidade e a herança dos estudantes em cada coletivo social", ao mesmo tempo em que reforçava que as "relações íntimas entre judeus e não judeus ameaçam a separação de identidades", de acordo com o jornal "Haaretz". Desde então as queixas e denúncias inundaram as redes sociais, com famosos comprando o livro e tirando fotos com ele. "Minhas felicitações ao Ministério da Educação que conseguiu fazer de 'Uma barreira viva' um livro de leitura obrigatória", disse o prefeito da liberal Tel Aviv, Ron Huldai, que classificou o romance como "fascinante". A principal biblioteca desta cidade pendurou um cartaz no qual anuncia a disponibilidade do livro sem pagamento algum, enquanto as principais livrarias faziam pedidos públicos à editora Am Oved para que lhes forneça mais exemplares, dada a demanda gerada pela polêmica. Rabinyan, que entre 1995 e 1999 publicou com notável sucesso seus dois primeiros romances - traduzidos cada um a oito idiomas -, tem outro título entre os recomendados do Ministério da Educação, mas estava há 15 anos sem publicar e tudo o que tinha lançado desde então era um livro infantil. À campanha de protesto se somaram escritores de renome internacional como A.B. Yehoshua ("Me sinto ultrajado"), Hayim Beer ("Daria a Bennett o título de membro honorário da Lehavá", uma organização de extrema-direita) e Natan Zach ("O ministro da Educação é tolo e com os tolos não há nada o que fazer"). No entanto, todos concordam com a autora em que Bennett deu definitivamente um impulso comercial ao romance, agraciado este ano com um conhecido prêmio local de literatura. "De repente me transformei em um assunto noticioso, (...) agora sou uma personalidade pública", disse a escritora, com ironia, ao serviço de notícias "Ynet". Rabinyan comentou que seu romance não atenta contra a identidade judaica, mas unicamente "reflete a complexidade da sociedade israelense" e seus medos frente à assimilação. "Acham que proibir o livro fará o problema desaparecer, mas o livro é só um espelho da sociedade. Sua grande força está precisamente na sensibilidade que demonstra", afirmou a escritora israelense de origem iraniana. (G1)