Comissão de Saúde da ALBA promove debate sobre atenção às crianças com autismo

A Comissão de Saúde e Saneamento da Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA) realizou nesta quinta-feira (27) uma audiência pública para debater a Atenção às Crianças com Autismo e outros Transtornos do Neurodesenvolvimento. Proposta pelo deputado Hassan (PP) e pela deputada Fabíola Mansur (PSB), o evento discutiu, entre muitas propostas e medidas a serem tomadas, a criação de um Centro de Excelência em Neurodesenvolvimento na Bahia, que teria como um dos principais objetivos a oferecer às crianças com transtornos de neurodesenvolvimento (TND), a exemplo das com Transtorno do Espectro Autista (TEA), a oportunidade serem tratadas com precocidade, num local capacitado e especializado.

O presidente da Comissão de Saúde e Saneamento, deputado Alex da Piatã (PSD), mostrou-se feliz de ver a audiência com grande participação pública e desejou que todos fossem bem-vindos. “Queria parabenizar o deputado Hassan, junto com a deputada Fabíola, pela iniciativa e pela proposição tão sensível e tão importante para o nosso Estado, que é pauta em 100% dos municípios…. Que daqui possam tirar muitos bons proveitos e bons encaminhamentos, para que, de fato, a gente possa dar contribuição ao lado do nosso governador Jerônimo Rodrigues, para o melhor tratamento e acompanhamento do autismo na Bahia”, disse.

O deputado Hassan, que é autor de indicação ao Governo do Estado solicitando a criação do Centro de Excelência em Neurodesenvolvimento, explicou que a atuação de profissionais especializados no cuidado de crianças com TND, como médicos neurologistas, psiquiatras infantis, psicólogos, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, com conhecimentos e habilidades específicas para avaliar o desenvolvimento da criança e identificar possíveis problemas, é determinante para garantir diagnóstico preciso e tratamento adequado.

Convidada pelo deputado Hassan, que presidiu os trabalhos, a Drª. Fernanda Debourg, neuropediatra, defendeu a criação do Centro de Excelência. Ela explicou que a criança com TND geralmente tem ao menos dois transtornos associados, com causas multifatoriais, o que exige a atenção de diversos profissionais. Trouxe o dado de que, segundo órgão de saúde dos EUA, uma a cada 36 crianças de 8 anos tem, hoje, o diagnóstico de autismo e afirmou que o atendimento precoce é de suma importância para o desenvolvimento dessas crianças. Na Bahia, segundo a médica, há um subdiagnóstico, pois muitas das crianças não passam por avaliação especializada.

“Como o deputado Hassan colocou, são as janelas de oportunidades do cérebro. O que isso significa? É o melhor momento para aquele cérebro aprender, para aquele cérebro diminuir as dificuldades que ele tem. Então, nos primeiros seis anos de vida, a criança vai desenvolver habilidades motoras de linguagem, de percepção de totalização. Se a gente perde essa janela, porque o diagnóstico e o tratamento não foram iniciados no tempo adequado, isso vai gerar mais prejuízos no decorrer da vida dessa criança”, explicou Debourg.

MÃES

Sem desprezar a iniciativa de criação do Centro, Marleide Nogueira, mãe e coordenadora do Instituto Lagarta Vira Pupa e vice-presidente da Associação Mãe Autismo, fez um discurso emocionado lembrando a todos que os problemas do autismo não se resumem à primeira fase, ainda na infância. “Perdão, as falas me cansaram um pouco, porque insistem em colocar o autismo na fase adulta no apagamento. Autista cresce, se transforma em adolescente, em adulto, em idoso. Esse apagamento é histórico. É incrível a gente ter que reafirmar a nossa existência”, iniciou.

“Eu quero dizer que o autismo não impacta apenas o indivíduo. Eu estou aqui representando as famílias. Eu estou aqui representando, além das famílias, um recorte que é alvo dessa sociedade capacitista, que exclui, que rotula. São, na maioria, mães sozinhas, mulheres pretas, periféricas, que dependem de tratamento gratuito. Dói, porque essa mulher sai da casa dela na periferia, pega um busão lotado, debaixo de um julgamento de olhares de passageiros, porque (os filhos) não têm as características físicas (ditas padrões). A gente tem que se enquadrar, tem que se encaixar nesse padrão, que para mim é um padrão que não dá mais”, lamentou Marleide.

Emocionada, prosseguiu: “E quando ela (a mãe) consegue uma vaga (para o filho), porque a demanda é muito maior do que a oferta, é para ficar nas terapias de 15 a 30 minutos. Como falar do sujeito autista e não falar dessa mulher, não falar da família dele? A leitura é em um todo, impacta. Qual pode ser o melhor tratamento? Se não cuidar de quem cuida, de nada adianta. Se não pensar nesse sujeito, onde ele está inserido, na condição de moradia, na alimentação, na educação, de nada adianta, vai ser apenas falácia”.

Marleide alertou para o fato de que o Centro de Excelência em Neurodesenvolvimento ou qualquer outra política pública precisa envolver toda a família. “Deixar claro que estamos falando de pessoas. A adaptação não é nossa. É da sociedade a responsabilidade pela existência da nossa família e pela existência do nosso filho… A questão central é uma sociedade que não gera mudança. Vocês falam problemas? Não é. O autismo não é doença. A questão é o sistema, não é o autismo dos nossos filhos, porque o autismo é uma condição, é a identidade dele, é como a cor da minha pele. Não tem nada para ser corrigido no nosso filho. A intervenção que a gente precisa é de oportunidades para que ele se desenvolva em todos os ambientes, pois a forma do desenvolver dele realmente é diferente”, concluiu Marleide, ressaltando que a solução passa pela necessidade do apoio dos profissionais especializados, do poder público e das famílias.

O deputado Hassan e a deputada Fabíola parabenizaram a fala importante da coordenadora do Instituto Lagarta Vira Pupa. Hassan fez questão de informar que o Centro proposto terá, sim, uma função mais ampla e que muito havia a ser feito. Disse também que estava protocolando na Casa a criação de Frente Parlamentar para tratar do tema, convidando os colegas presentes. Fabíola ressaltou que a audiência era para debater todas as questões relacionadas ao tema e convidou Marleide para participar de um grupo de trabalho com essa finalidade.

COMPROMISSO

O deputado Hilton Coelho (Psol) disse que a sua fala era uma declaração de compromisso. “Isso aqui foi quase um seminário, porque nós tivemos a oportunidade de ter, de maneira didática, a realidade efetiva. Ficou evidente para todo mundo, para mim como deputado, que é uma situação extremamente complexa. E, ao mesmo tempo, houve uma produção extremamente rica, que vem da fala das mães. Um conjunto de caminhos e soluções já elaborados e que precisam do reconhecimento. Então, eu quero valorizar a ideia de que nós precisamos sobretudo dar visibilidade a essa questão”, disse o deputado. “É preciso ter essa relação, especialmente com as mães, e se alimentando para fazer da Assembleia Legislativa, de fato, a grande caixa de ressonância da política institucional em relação a essa situação absurda”, finalizou, colocando o seu gabinete à disposição.

Já o deputado Júnior Nascimento (UB) saudou os colegas e os participantes que lotaram duas salas de reunião das comissões e disse que, em sua atuação como vereador do município de Campo Formoso, por quatro mandatos, foi autor de projetos de lei voltados à inclusão social, hoje tornados leis. “É uma bandeira que eu usei na campanha. E quando cheguei aqui no Parlamento vi tantos deputados abraçando a mesma causa. Isso nos alegra. Só no mês de abril, principalmente por ser um mês alusivo ao autismo, por causa do 2 de abril, diversos projetos foram protocolados, nesta Casa, voltados ao autismo”, contou o parlamentar. Por fim, ele convidou a todos para a sessão solene em alusão ao Dia do Autismo, as ser realizada na próxima quinta-feira (4 de maio), às 14h30, no Plenário da ALBA.

O deputado Robinson Almeida (PT) contou que tem uma filha com algum transtorno de neurodesenvolvimento que não foi confirmado como autismo e observou a dificuldade de se ter diagnóstico e tratamento da parte do Estado. “A minha voz como deputado estará a serviço da voz de vocês do movimento, porque eu também faço parte dele, e nós vamos juntos juntar os esforços e pressionar o poder público para construir políticas públicas para essas pessoas”, declarou.

Por sua vez, a deputada Olívia Santana destacou que a grande maioria no evento era feminina. “Quem segura a onda do cotidiano, do cuidado do idoso, da pessoa com deficiência são as mulheres. É muito importante que esta Casa abra esse debate, porque nós precisamos discutir uma infraestrutura de cuidados, que é um desafio civilizatório para o Brasil e a Bahia”, disse a parlamentar, que sugeriu o encaminhamento da súmula da reunião para o Ministério de Desenvolvimento Social.

Coube à deputada Fabíola Mansur (PSB) fazer o encerramento da audiência, apontando os diversos caminhos extraídos do debate. A criação do grupo de trabalho, a Criação do Centro de Excelência em Neurodensenvolvimentos foram alguns dos pontos retratados, assim como os vazios assistenciais dos municípios e o fortalecimento dos Centros Especiais de Reabilitação, da Rede de Atenção Social. A legisladora disse ainda que era necessário fazer uma visita ao Cretea (Centro de Referência Estadual para Pessoas com Transtorno do Espectro Autista), e lembrou da necessidade de transdisciplinaridade entre as secretarias com relação ao tema e, também, da multiplicidade de profissionais envolvidos no atendimento.

“Eu quero sugerir, Hassan, que se retome a Frente Parlamentar em Defesa da Pessoa com Deficiência, pois são inúmeras as questões que precisam ser endereçadas”, disse Fabíola. Ela citou ainda que é necessário fazer visita aos órgãos de transporte, para garantir o direito da cidadania de ir e vir das pessoas com TEA. Lembrou também as denúncias, na reunião, da ausência de auxiliares de desenvolvimento infantil (ADIs) e de auxiliares terapêuticos (ATs), o que impossibilita a inserção de alunos com TEA em sala de aula.

Fabíola citou ainda, entre outros assuntos, a necessidade de formação e capacitação de profissionais, a disponibilização no SUS de tratamento com Canabidiol, e a estruturação de políticas para os transtornos de neurodesenvolvimento, temas que vieram à tona no debate.

Fonte: Ascom Alba

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