‘Não há homem perfeito’, diz pastor de Bolsonaro


Como as de tantos outros pastores, as redes sociais de Josué Valandro Jr., 49, ganharam tintas políticas nas últimas semanas. Tudo em prol do candidato abraçado por 7 entre 10 evangélicos, Jair Bolsonaro (PSL).

Após o triunfo do homem que popularizou o slogan "Brasil acima de tudo, Deus acima de todos", Josué deu parabéns: "Conte com nossas orações!". A 11 dias do segundo turno, publicou um bom recadinho, tudo em maiúsculas, sobre fundo verde-amarelo: "Nós, evangélicos, estamos falando sobre política hoje para não sermos proibidos de falar de Jesus amanhã".

Entre a legião de líderes evangélicos que encontrou no católico Jair Messias Bolsonaro um presidente que vá lutar por moral e bons costumes, Josué tem algo que a maioria não tem. Acesso ao homem.

Ele lidera a Igreja Batista Atitude, no Recreio (zona oeste carioca), onde vai Michelle Bolsonaro. A mais ilustre fiel lhe garantiu uma ponte com o marido e futuro presidente.

Neste domingo (4), Bolsonaro subiu ao púlpito e nele orou, ficou de joelhos, chorou e atribui a vitória a Deus.

"Se isso tudo [o resultado] aconteceu, só tem uma explicação: Deus que decidiu. Nenhum cientista político conseguiu explicar o velho garoto que tinha apelido de Palmito ter chegado aonde chegou."

Não era sua estreia naquele altar. Em agosto, mais uma vez ali lacrimejou e falou sobre "varrer o comunismo do Brasil". Especialistas apontaram propaganda irregular, já que a lei eleitoral proíbe campanha em "bens públicos de uso do povo", de igreja a estádio.

Antes e depois do triunfo de Bolsonaro, o pastor foi recebido na casa do casal. Também visitou o candidato recém-esfaqueado pelo homem que depois Michelle definiria como "um ser humano muito mau" .

Michelle começou a frequentar a Atitude em 2017, após visitar a sede e se sentir "muito tocada", conta Josué.

Antes ela ia à igreja de Silas Malafaia, e a troca de denominações se deu meses após o pastor ser indiciado numa operação da Polícia Federal e brigar com Bolsonaro, por se achar abandonado na hora difícil. Malafaia chegou a gravar um vídeo sobre a "direita radical" que quer "fechar o Congresso" -já fez as pazes com o amigo e disse que falou "besteiras" por estar chateado.

A desavença ajudou a empurrar Michelle para a Atitude. Intérprete de Libras, ela fica na primeira fila, com fiéis surdos -auxiliou inclusive no preparo do grupo para tocar no bloco carnavalesco da igreja, "Sou Cheio de Amor".

Josué recebeu a Folha em seu escritório na igreja e, por uma hora e meia, desfiou o corolário bolsonarista. Falou sobre 1964, ano do golpe tão querido por Bolsonaro, como o início de uma temporada em que "tivemos muitas coisas ruins, né?" Mas ao menos "nunca caímos no comunismo".

"Quem matou homossexual à beça foi Fidel Castro. Não sei de nenhum homossexual morto no regime militar", diz. A Comissão Nacional da Verdade, que investigou violações de direitos humanos pela ditadura, tem textos sobre perseguições a grupos LGBTQ.

Já 2018 entrará para a história como o ano em que "as famílias cristãs salvaram o país", afirma Josué. "Um dia aqueles tristes com o apoio [a Bolsonaro] vão nos agradecer."

O filho de um pastor batista que, após trabalhar num banco de investimento, seguiu os passos do pai ataca a esquerda em todas as frentes que pode.

Abraça a versão de que o "kit gay" -pacote anti-homofobia gestado, mas nunca veiculado, no governo Dilma- ensina a crianças orgias e que é ok um "menino de 12 anos decepar seu pênis". A idade mínima para mudança de sexo no SUS é 18 anos.

Não acha Bolsonaro o racista que setores progressistas dizem ser. Aliás: "Discordo chamar negro de minoria. Calma aí, o principal jogador da história [Pelé], e o maior artista, Michael Jackson, são negros".

Duvida inclusive "das estatísticas de que negro morre mais". Argumenta: "Quase não vou em enterro de negro, já em enterro de branco vou a toda hora. Sério mesmo".

O pastor canta o jingle "Lula lá" para confessar que, sim, num passado do qual hoje quer distância, ele votou no petista. "Já fui enganado."

Se a maioria evangélica foi de Bolsonaro agora, não pense a esquerda que o bloco não conhece o candidato que ungiu.

"A gente precisa entender que não há homem perfeito. Ele falou algumas coisas que não foram boas. Essa brincadeira, por exemplo, de falar 'dei uma fraquejada' [quando nasceu a única filha, Laura]. Estamos ficando um país chato. Toda brincadeira que era normal de homem, quando é o Bolsonaro, é levada à última instância da falta de senso. Agora ele virou machista por causa disso?"

Ao menos com o marido de Michelle o "marxismo cultural que inibe as pessoas de dizer o que sentem" acabará, aposta.

Já Bolsonaro nutre o "desejo de união da nação, pois a esquerda tenta dividi-la o tempo todo", diz o pastor que, na ponta da língua, traz sempre o versículo bíblico "Anunciar-te-ei coisas grandes e firmes que não sabes". BN

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