Um falso familiar do Santo Ofício aplicando golpe em Jacobina

*Por João Batista Ferreira 

A história de Jacobina, município localizado no interior do estado da Bahia, Brasil, é repleta de episódios marcantes e reviravoltas que, em muitos casos, se entrelaçam com eventos de grande relevância histórica, como a Inquisição Portuguesa. Baseado na monografia publicada pela Universidade Federal de Sergipe, escrita por Joseane da Costa Santos, este artigo explora a relação de Jacobina com a Inquisição Portuguesa durante o século XVIII.

No período em questão, Januário de São Pedro, conhecido por suas ações controversas, passou a se autodenominar, em algumas ocasiões, como comissário e em outras como familiar da Santa Inquisição. Para ocupar esses cargos, era necessário passar por um processo de habilitação, o qual Januário não havia concluído com sucesso. De acordo com Francisco Bethencourt, os familiares inquisitoriais formavam uma rede de apoio aos tribunais, desfrutando de privilégios como licença para portar armas, isenção de impostos, isenção de serviço militar e indulgência plenária.

A busca por cargos como esse cresceu no início do século XVIII, e Januário não perdeu a oportunidade de tirar proveito disso. Conhecendo as denúncias contra João de Souza, um fazendeiro local, Januário reuniu um grupo de pessoas e partiu para prendê-lo em nome do Santo Ofício. Durante essa operação, os bens de João de Souza foram confiscados e entregues a terceiros, enquanto Januário se apropriava de uma quantia significativa de dinheiro para cobrir os gastos de sua jornada até Salvador.

O tempo que decorreu desde a prisão de João de Souza até sua entrega ao comissário em Salvador foi considerável, demonstrando a complexidade e a lentidão do processo. No entanto, durante a viagem, Januário buscou fortalecer as acusações contra o fazendeiro, incluindo a introdução de um relicário de ouro com uma partícula consagrada como evidência. Muitos que o acompanhavam como testemunhas ao longo da jornada desistiram devido à extensão da viagem.

A confissão de Januário revelou informações sobre suas ações e outros crimes cometidos durante a viagem. Ele também emitiu notificações de culpas para indivíduos que tentaram intervir na prisão de João de Souza. Ao longo da viagem, várias pessoas fugiram da comitiva, incluindo Manoel Alves, um professor local. Aqueles que fugiram foram excomungados, e Januário aplicou penitências específicas a eles.

Apesar das dificuldades ao longo do percurso, Januário conseguiu chegar a um porto onde, usando sua autoridade falsa de familiar da Inquisição, obrigou barqueiros a levá-lo e à comitiva para Salvador. Em novembro de 1739, ele entregou João de Souza e as testemunhas ao Comissário Antônio Rodrigues Lima na cidade.

Esse episódio da história de Jacobina, embora obscurecido pelo tempo, revela a complexidade e a influência da Inquisição Portuguesa mesmo em regiões distantes como o interior da Bahia. Além disso, destaca como indivíduos como Januário de São Pedro exploraram as oportunidades oferecidas por esses cargos para benefício pessoal, criando situações controversas que afetaram a vida das pessoas da comunidade. Jacobina, como tantas outras cidades, guarda em sua história esses capítulos intrigantes e muitas vezes desconhecidos, que merecem ser estudados e relembrados como parte do patrimônio histórico do Brasil.

João Batista Ferreira – radialista/jornalista – bacharel em Serviço Social

Leia a íntegra do excelente trabalho de  Joseane da Costa Santos em ” Um falso Familiar do Santo Ofício nos Sertões da América Portuguesa (1735 – 1744)”:

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