Após cirurgia, situação neurológica de gêmeas unidas pela cabeça ainda é incógnita


Após a histórica cirurgia de separação de gêmeas siamesas unidas pela cabeça, concluída com sucesso no domingo (28) no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (a 313 km de São Paulo), o desafio agora é conhecer o resultado final do ponto de vista neurológico das crianças.

Caso único na história da medicina brasileira, a separação das gêmeas siamesas Maria Ysabelle e Maria Ysadora, de 2 anos e 3 meses, foi possível após cinco procedimentos cirúrgicos, iniciados em fevereiro.

Segundo o neurocirurgião pediátrico Marcelo Volpon, agora será preciso avaliar se elas terão algum tipo de déficit.

"Por enquanto elas estão bem no sentido de que mexem os braços, as pernas, elas estão respondendo. Mas a gente precisa saber qual vai ser o resultado final do ponto de vista neurológico, como vai ser o desenvolvimento de fala, de atenção, a parte intelectual, tudo isso vai ter de ser visto e tem de ser estimulado, claro. Atividade de reabilitação muito prolongada", afirmou.

Ele e o também neurocirurgião pediátrico Ricardo Santos Oliveira foram responsáveis pela "soltura" das crianças, momento que ambos classificaram como emocionante. No momento em que isso ocorreria, as 21h09 de sábado (27), ambos chamaram os médicos Helio Machado e James Goodrich, comandantes da operação.

"Foi muito emocionante, eu com uma, Marcelo com a outra. Trocamos algumas palavras [antes], pedimos a presença do Goodrich e do professor Helio. À medida que se soltaram, acho que esse é o termo, ficar com uma na mão e o Marcelo com a outra foi muito emocionante", disse Oliveira.

A equipe médica, que envolveu cerca de 40 profissionais, comemorou quando ocorreu a separação. Mas por poucos segundos. Em seguida, as crianças foram colocadas em mesas cirúrgicas diferentes para que fosse feita a reconstrução dos crânios.

"Tinham uma faixa de cérebro fundido bastante grande. Sabíamos disso, mas foi a parte mais complicada. Mas deu tudo certo", disse Volpon.

As crianças estão clinicamente bem nesta segunda-feira (29), segundo Machado. "Tudo correu muito bem, elas estão bem, as duas sem respirador. Os especialistas trocaram curativos e elas estão passando muito bem", disse.

As gêmeas devem ficar em Ribeirão por mais alguns meses. A alta da UTI deve ocorrer em uma semana, mas a alta hospitalar deve demorar mais algumas semanas.

Volpon afirmou que após o período inicial da reabilitação elas poderão voltar para o Ceará, onde nasceram, para fazerem a sequência do processo, mas terão o desenvolvimento acompanhado pelo HC.

Uma das gêmeas, Maria Ysabelle, terá de passar por novo procedimento em duas a três semanas, para revestir uma parte da cabeça com enxerto de pele, que será retirada de sua coxa, segundo o cirurgião plástico Jayme Farina.

Também cirurgião plástico, Pedro Colto disse que esteticamente o procedimento foi bem sucedido. "A montagem da nova calota craniana ficou relativamente arredondada e retalhos de pele cobriram de forma bastante satisfatória os defeitos", disse.

As gêmeas e seus pais estão em Ribeirão Preto desde fevereiro, quando foi feito o primeiro dos cinco procedimentos cirúrgicos a que foram submetidas.

Segundo os relatos médicos, os pais das meninas ficaram radiantes quando receberam a notícia da separação, que ocorreu após mais de 14 horas de cirurgia. Apesar disso, o procedimento todo --que incluiu cirurgia plástica-- só foi concluído já na madrugada de domingo.

O processo foi tão complexo que envolveu o neurocirurgião americano James Goodrich, do Montefiore Medical Center, de Nova York, considerado um dos maiores especialistas do mundo no assunto.

A família das gêmeas é de Patacas, distrito de Aquiraz (CE), mas se mudou para Ribeirão por mais conforto e para evitar deslocamentos.

A primeira cirurgia foi realizada em 17 de fevereiro e, assim como a segunda, feita três meses depois, foi bem-sucedida. Em agosto, foi a vez do terceiro procedimento, um dos mais complexos da série, que deixou os cérebros praticamente separados. Só na parte neurológica, a operação durou cerca de sete horas e mobilizou 25 pessoas.

No mesmo mês, passaram por um novo procedimento, com a implantação de expansores subcutâneos.

O valor de uma cirurgia como essa é calculado em US$ 2,5 milhões (R$ 9,1 milhões) na rede privada dos EUA. Na rede pública, como é o caso das meninas, o custo é menor. BN

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